De vez em quando sou pega de surpresa por algum sentimento que eu achava que há muito tempo estava morto e enterrado debaixo do cotidiano. Acontece muito quando ouço uma certa música, algum disco que escutava todos os dias na época em questão, e que me fazem lembrar da seqüência dos acontecimentos que me fizeram ou muito feliz ou muito triste. Obviamente, essas épocas estão sempre associadas a alguém que não participa mais da minha vida: ou porque perdemos contato, ou porque brigamos (são raros os casos, mas existem), ou porque a pessoa morreu.
Ontem o Japanimation me perguntou como foi o dia da morte da minha mãe. Nunca ninguém havia me perguntado isso antes, e eu encarei a conversa da forma como sempre faço quando comento que fui criada pela minha avó: com mais preocupação em não constrager o ouvinte do que em relembrar o momento.
E aí comecei a narrar, com riqueza de detalhes, as mãos suadas do meu pai quando ele foi me pegar na casa de uma amiguinha onde eu havia passado a noite, toda a família reunida em casa e todos estranhos como eu nunca tinha visto antes, o telefone que não parava de tocar e a notícia que o meu pai teve que dar sozinho para minha irmã e eu, ela com 6 e eu com 8 anos, e de como eu não chorei no dia e achei isso esquizito, e de como a minha irmã chorou e disse que estava com uma dor no coração e que também deveria estar doente, e de como voltamos pra casa da minha amiga enquanto o resto da família foi para o enterro, e da mãe da minha amiga oferecendo colo e a gente brincando sem entender totalmente a situação.
Na medida em que eu fui narrando, fui sentindo os olhos enchendo de água e fiquei surpresa por ainda restar alguma lágrima para chorar sobre o assunto que me acompanha há tantos anos, e que há muito deixou de ser tabu. Ele me abraçou e pediu desculpas e eu disse que tudo bem, que na verdade era até bom saber que esse amor ainda existia, mesmo depois de camadas e camadas de ausência.
4 comments:
Sempre vai restar uma lágrima gatinha. Beijinhos ;)
Bruna,achei tao bonito esse post e me fez lembrar de um trecho de uma musica do Peninha, que o Caetano canta, que diz: "saudade até que é bom, melhor que caminhar vazio" E falar da saudade tb e bom pois alem de relembrar faz desaguar o lado ruim da saudade.
Quase chorei...
muito bonito o texto de hoje, bruna.
beijoca!
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