Devido à minha assumida preguiça de fazer as unhas e cuidar dos cabelos e frequentar saloes de beleza, de vez em quando penso que queria ser homem. É um desejo antigo, remonta da época dos twenty something e nada tem a ver com sexualidade, mas sim com a admiração pela facilidade com que os participantes do gênero masculino levam a vida. Eu bem que queria acordar, olhar pra uma mega bunda e ficar, instantaneamente, de bom humor. Mas não, eu tinha que nascer mulher, e precisar de uma bela bunda masculina pra olhar de manhã, e mais umas roupas novas, uns quilos a menos, um cabelo menos ressecado e um salário melhor. Ah, sim, e precisaria também, além da bunda e de tudo mais, de um bom livro e um bom filme e alguma promessa de satisfação da alma para que o meu dia comece bem e, com isso, eu fique de bom humor.
Se bem que, de vez em quando, me entrego aos simples prazeres da vida masculina quando sento em uma mesa de bar e ouço os comentários e desfilos piadas de quinta série, mas que naquele momento fazem sucesso e, quando percebo, eu praticamente tenho um saco. Mas é tudo mentira, é claro: eu continuo sendo menina, mas imagino que tenho um saco e rio de piadas de salão com uma satisfação sincera.
Fiz balé na infância, gostava da Cinderela e queria casar na igreja, de véu e grinalda e vestido de bolo. De algum jeito, não sei bem como, tudo isso desapareceu e deu lugar às olheiras e ao dente escuro e às unhas descascadas segurando um copo, ou gesticulando e derrubando a tulipa, ou sentando em cima do calcanhar para ouvir histórias alheias.
É libertador ter me livrado da torre do castelo, mas não conta pra ninguém que eu ainda gosto de usar luvas até o cotovelo, e aproveito as festas à fantasia pra vestir a minha roupa de Breakfast at Tiffany's.