Thursday, April 12, 2007

Retratos

Na última vez que voei de BH para o Rio, estava sentado ao meu lado um cara que segurava a foto da namorada. Ele havia baixado a mesinha e colocado o retrato em cima. Depois, fechou o tampo e pendurou a fotografia na trava da mesa, de modo que a moça da foto ficava olhando para ele. E foi nessa posição que eu pude espiar que imagem era essa que ele tanto admirava.

A foto era de uma menina sentada no banco do que parecia ser uma praça de cidade pequena. Ela sorria, com os cabelos ondulados chegando à cintura, um chapeuzinho de tricô na cabeça. O rapaz não sabia muito bem o que fazer com a foto: ele guardava no bolso esquerdo na camisa, depois tirava e ficava olhando um pouquinho, tornava a guardar, tornava a tirar e a prender na trava da mesa... Era uma dança que não tinha fim. Imagine que, a essa altura, eu já estava quase pulando em cima dele de tanta vontade de perguntar quem era a moça da foto, se ele ia ficar muito tempo longe dela, se ia encontrar com ela no Rio... Fiquei com uma baita curiosidade, mas não mexi um centímetro do rosto. Nosso único contato (fora o bom dia que eu sempre dou a quem voa ao meu lado), foi quando ele procurou, sem jeito, ajeitar o encosto da poltrona. Apontei para o botão e falei meio baixinho "tem que apertar aqui", e ele sorriu muito sem graça - e eu sorri de volta, retribuindo o acanhamento. E o retrato da moça lá, por perto.

Mas foi na hora da decolagem que eu entendi a função da fotografia. No momento em que o avião acelerou para começar a subir, o cara fez o sinal da cruz, e agarrou com força a imagem da menina sorridente. Sua respiração só voltou uns cinco minutos depois, com o avião já estável no ar.

Achei tudo tão lindo! Que manteiga derretida que eu sou. Nunca cheguei a conversar com meu vizinho de vôo e, pra falar a verdade, a lembrança dele sumiu da minha cabeça assim que pisamos na cidade maravilhosa, louca que eu estava para voltar para casa. Mas hoje, confesso que a história do homenzinho me veio à tona, meio sem razão aparente. Na verdade, eu sei bem porque esse homem ressurgiu: simplesmente hoje eu me vi como ele, olhando uma fotografia esquecida no fundo da carteira da mesma maneira que ele olhava para a foto da noiva (noiva?)

A grande diferença entre o homenzinho e eu é que ele recuperou o fôlego cinco minutos depois da decolagem.
E eu ainda estou sem ar.

1 comment:

bastaestarvivo said...

ah, bruna, abusadamente lindo isso.